Pedro do Coutto
Em matéria publicada na Revista Veja que está nas bancas, o jornalista Otávio Cabral analisa o que considera um plano estratégico do presidente Lula para a sucessão de 2010e conclui que, além da ministra Dilma Roussef, ele tem hoje como segunda opção o deputado Ciro Gomes. Pode ser. Mas o próprio Otávio Cabral define, com razão, que arquiteturas políticas assim só funcionam no papel. Está certo. É impossível alguém, muito menos o presidente da república apoiar dois candidatos à sua própria sucessão. Termina não apoiando nenhuma, sobretudo em função das contradições que, em decorrência, vão se evidenciar nos quadros partidários da base aliada.
O empenho de Lula é pela manutenção da aliança de chapa. Um aceno no sentido de Ciro, é claro, rompe o equilibro e abala a aliança. Principalmente porque o presidente não poderia consultar o partido de Michel Temer sobre tal dualidade. Além do mais desnecessária, já que se as eleições são em dois turnos.E ninguém poderá vencê-las já no primeiro. Maioria absoluta nem por sonho. Lula não a conseguiu nem em 2002, nem em 2006. Aproximou-se, mas não a alcançou. A investida de Ciro Gomes na hipótese de suplantar a chefe da Casa Civil e travar o duelo final com José Serra é outro assunto.
Se tal hipótese viesse a acontecer, seria extremamente improvável que pó ex governador do Ceará pudesse unir o PT em torno de seu nome, e muito menos o PMDB, sobretudo porque uma ala da legenda, a de Orestes Quércia,defende aliança com o governador de São Paulo.Assim, plano B pode ser algo pessoal de Ciro,não de Lula. Inclusive Lula joga para o futuro, como é natural, sua visão projeta-se para 2014.
Ciro foi candidato em 98 quando teve 10% de votação. Repetiu a presença em 2002 e registrou 12%.Havia decolado bem,mas cometeu erros ao longo da campanha,na primeira vitória de Lula, que o colocaram em terceiro lugar.No primeiro turno, Lula atingiu 47 pontos,contra 23 de Serra, 18 de garotinho.No segundo turno, curioso, os 30% de Garotinho e Ciro dividiram-se em partes iguais: Lula subiu de 47 para 62 e Serra de 23 para 38. A impressão que ficou de Ciro nas duas campanhas é que ele começa bem, mas sua candidatura perde força no decorrer dos acontecimentos. Mas esta é outra questão.
No caso de seu nome passar a ser uma alternativa para o Planalto, a impressão que dá é que Lula fez um aceno mais para forçar a mobilização do PT em torno de Dilma Roussef do que para conduzir a um divisionismo, uma duplicidade. Ele deve estar tentando produzir um impacto, principalmente junto aos setores que não confiam na perenidade de uma articulação com Ciro. Este o panorama sob o ângulo de Luis Inácio e do PT. Sob o ângulo de Ciro Gomes é outra a questão. As pesquisas do Datafolha, Sensus e agora Ibope, descortinaram uma nova leitura do cenário. Mas também é preciso considerar que é um pouco cedo para interpretações mais precisas.
Política tem tempos certos que somente a sensibilidade do momento identifica. Porém uma coisa é certa: dualidade de candidaturas não é possível. Apoios políticos, para funcionar, têm que ser incondicionais, sem restrições, vacilações. Sem atitudes pendulares. Pois o movimento pendular desfoca o sentido e reduz o impulso a favor. Não funciona. E, sobretudo, reflete-se na decisão do segundo turno. Não existe exemplo de apoio duplo na política brasileira que tenha dado certo. Pelo contrário.