Carlos Chagas
Ao enquadrar o PT, o presidente Lula pode ter evitado o naufrágio político do senador José Sarney. Os companheiros engoliram mais um édito do trono, sua bancada no Senado posicionou-se contra o afastamento do presidente da casa. Como compensação, o presidente obtém do PMDB a submissão aos seus desígnios. Em termos aritméticos, solidifica o apoio da maioria, somados os penduricalhos do PTB, PR e afins.
A partir da permanência de Sarney na presidência do Senado o governo terá mínimos problemas para a aprovação de seus projetos. O lance do Lula, porém, é mais alto: politicamente, apesar dos naturais estrilos das oposições, terá conseguido domar os senadores. Isso significa caminho livre para a candidatura de Dilma Rousseff à presidência da República e…
E, se o vento mudar e a necessidade exigir, até mesmo a incorporação do Senado ao terceiro mandato, à convocação de um plebiscito ou à prorrogação de todos os mandatos por dois anos.
Numa palavra, a onça transforma-se num gatinho. Até pouco o Senado aparecia como obstáculo difícil de ser transposto pelo governo. Com a decisão de impor ao PT a permanência de Sarney, somada à solidez da bancada do PMDB e aliados, dissolvem-se os temores. O caminho está livre, mesmo ignorando-se onde vai dar.
Ativismo estatal
Devagar, sem proselitismo, José Serra vai colocando tijolos no edifício de sua candidatura. Depois de investir contra o PT, acusando os companheiros de usarem o governo como se fosse propriedade privada, o governador paulista avança concepções para o futuro. Em recente festa de aniversário do PPS, partido que o apóia, reconheceu a falência do neoliberalismo, sepultou a história do estado-mínimo e da prevalência do mercado na economia e inovou, anunciando “o ativismo estatal”. Traduzindo: a necessidade de o poder público atuar ativamente na condução do processo econômico. Não apenas gerir as políticas sociais, mas agir junto com a iniciativa privada para a construção de um projeto nacional de desenvolvimento e afirmação na comunidade internacional.
Pode estar nessa definição a primeira surpresa do que seria o governo Serra, no caso de sua eleição, ano que vem. Nada parecido com o passado governo Fernando Henrique Cardoso e, mesmo, coisa diferente do governo Lula. Uma ação permanente do estado como indutor e, mais do que isso, propulsor do crescimento.
Com as devidas adaptações, o candidato tucano pode estar imaginando repetir Getúlio Vargas, para horror de alguns tucanos e outro tanto de mega-empresários nacionais e estrangeiros. Não será a ressurreição do ex-presidente da União Nacional dos Estudantes, exilado no Chile pela ditadura militar, mas uma estratégia com raízes em modelos tidos como ultrapassados. Será a revogação explícita de quem pensou no”Fim da História” e na prevalência eterna do capitalismo selvagem. Claro que uma conseqüência da recente crise econômica mundial.
Protesto do ministro da Defesa
Em audiência pública no Senado, esta semana, o ministro da Defesa, Nelson Jobim, vibrou tacape e borduna no projeto que acaba com o serviço militar obrigatório, em tramitação na Câmara. Declarou que a proposta visa descolar as Forças Armadas da nação.
Para Nelson Jobim, isentar a juventude do dever constitucional de servir às Forças Armadas equivaleria restringir a tropa ao profissionalismo, sem sua integração histórica com a população. Exército, Marinha e Aeronáutica já dispõem de quadros profissionais, essencialmente necessários, mas integram-se à nação através das sucessivas gerações de recrutas que cumprem tempo determinado nos quartéis, recebendo instrução militar, noções de civismo e, não raro, preparo para a vida civil.
O ministro foi aplaudido pelos senadores, pelo jeito dispostos a não permitir a transformação das Forças Armadas em tropa mercenária, desvinculada de suas raízes. É claro que apenas parte da juventude é selecionada para o serviço militar, dadas as dificuldades econômicas da absorção de todos, mas o que se encontra em jogo é o princípio.
A reforma do Ministério
Desde o começo do ano que se ponderava, no Congresso, sobre a necessidade de o presidente Lula antecipar a substituição dos ministros candidatos às eleições do ano que vem. O prazo para deixarem os cargos é 31 de março de 2010, data limite para a desincompatibilização, mas se apenas naquele mês o presidente fosse cuidar de substitutos, correria o risco de terminar seu mandato com um segundo time em campo. Precisaria valer-se dos vice-ministros e secretários, na maioria dos ministérios, pela dificuldade de encontrar fora deles quem se dispusesse a ser ministro apenas até dezembro. Promovendo desde já as reformas, haveria como sensibilizar pessoas com capacidade comprovada, afetas aos diversos setores. Porque dos 37 ministros atuais, perto de vinte arriscarão seu futuro nas urnas.
A súbita exoneração, a pedido, de Mangabeira Unger, abre para o presidente Lula uma alternativa. Não que o singular ex-ministro de Assuntos Estratégicos tenha pedido para sair visando candidatar-se, mas deu no mesmo a sua opção pela aposentadoria na universidade de Harvard. Resta saber quem será o novo ministro: alguém saído do banco de reservas ou uma contratação daquelas do tipo que o Real Madri acaba de fazer…