Pedro do Coutto
Nenhuma aplicação financeira pode perder a corrida para a taxa inflacionária do país, pelo menos a registrada pelo IBGE. Isso é lógico e evidente. Aliás, não só no Brasil, mas em qualquer parte do mundo. As aplicações em títulos públicos não podem, sob qualquer hipótese, serem envolvidas num esquema de juros negativos, como a tecnocracia classifica as operações marcadas pelo insucesso. A inflação brasileira prevista para este ano é de 6%. Assim, por exemplo, os títulos federais que lastreiam a dívida interna brasileira, hoje na escala de 2.3 trilhões de reais, têm que ser remunerados acima desse patamar. É a taxa Selic, na base de 11,75 % ao ano.
Em reportagem de Martha Beck, alguns economistas sustentaram que o poder Executivo terá que rever as formas de rendimento da poupança, do FGTS, e até dos fundos de pensão. Tem que rever por quê? Para fortalecer os fundos de investimento, claro.
Mas eles não traduziram corretamente o tema. Referem-se genericamente à indexação. E daí? Não dizem, por exemplo, que todos os contratos no Brasil, exceto os do trabalho, estão indexados a algum sistema automático. Não perdem para a inflação. Ao contrário do que acontece com os salários. A defasagem social está nítida..
A consequência mais direta deste problema é o agravamento de déficite habitacional e portanto a queda dos padrões sanitários. Já houve quem sugerisse taxar a poupança. Por trás desse debate que ameaça a rentabilidade das cadernetas está – isto sim – a tentativa de colocação de mais títulos do Tesouro no mercado a serem acrescidos à dívida interna. O governo Lula estava precisando captar mais recursos, mas não quer elevar a Selic. Pelo contrário. Então o caminho era transferir indiretamente parte da poupança para os títulos que sustentem o endividamento. Ainda bem que a idéia detaxar a poupança foi sepultada.
Um dos economistas desfocou a interpretação. Perguntou à repórter Martha Beck que, se os juros da Selic, por hipótese, decrescerem a 4% ao ano, o que aconteceria? Impossível. Se a inflação anual é de 6%, como poderiam os papéis da dívida interna descerem a 4%. Os aplicadores (bancos) com juros negativos desapareceriam do mercado. O país seria transformado num deserto financeiro. Essa não. Arranja outra desculpa.
(Este artigo foi republicado, porque Pedro do Coutto está em Paris)