Carlos Chagas
A Constituição exige maioria de votos para que um candidato assuma as funções de prefeito, governador e presidente da República. Para aprimorar esse princípio instituiu-se o segundo turno nas eleições onde nenhum dos candidatos obteve a maioria absoluta dos votos, ou seja, a metade mais um.
Veio a Justiça Eleitoral e atropelou a Constituição, não ao determinar a cassação dos governadores da Paraíba e do Maranhão, mas ao determinar que os segundos colocados na eleição de 2006 assumissem o poder. Poucos protestaram, tamanho o desgaste político que acometia aqueles estados, depois de meses de contestação do mandato dos eleitos pela vontade do povo, acusados de irregularidades eleitorais.
Pesou, tanto na decisão do Tribunal Superior Eleitoral quanto na aceitação de sua sentença pelas forças políticas, a pressão feita por forças federais majoritárias em favor da posse dos derrotados, José Maranhão e Roseana Sarney, ambos do PMDB, com padrinhos poderosos.
A moda acendeu ambições variadas, como a que agora atingiu o mandato do governador do Tocantins, Marcelo Miranda. O copo transbordou e a Justiça Eleitoral voltou atrás para não dar o poder aos derrotados. Assume o presidente da Assembléia até que os deputados estaduais decidam quem governará o estado até janeiro de 2011.
Fica em aberto, porém, a ferida das duas decisões anteriores. Por que não ter devolvido ao povo ou a seus representantes o direito de indicar os novos governadores, o TSE fica em sinuca. Sob que argumento justificar a chamada dos segundo colocados no Maranhão e na Paraíba, aqueles que não tiveram votos suficientes para eleger-se, quando o natural teria sido fazer o que os meretíssimos fizeram agora, dando à Assembléia Legislativa de Tocantins a prerrogativa de indicar o novo governador?
Nada se imputa de irregular na conduta de Roseana Sarney e de José Maranhão, apenas beneficiários da decisão anterior do TSE, tendo assumido os governos de seus estados. Ambos já haviam sido governadores, eleitos pela maioria, ainda que seus padrinhos e pais político-partidários tenham se desdobrado ao máximo para obter as sentenças.
O problema é que se tornaram, os dois ex-senadores, governantes ilegítimos, sem a representatividade constitucional necessária ao desempenho de suas funções. Ambos pretendem contornar essa esdrúxula situação candidatando-se à reeleição, ano que vem. Arriscarão suas biografias nas urnas, mas quem responderá pelo tempo em que estão ocupando de forma inconstitucional os governos de seus estados?
O eleitorado poderá perceber essa contradição e negar-lhes apoio. O resultado refletirá, de qualquer forma, uma sombra na Justiça Eleitoral.
E o etanol?
Por onde anda toda a empolgação de o Brasil servir como matriz da substituição do petróleo pelo etanol? O que fazer daquelas peregrinações do presidente Lula pelo mundo, tentando convencer até George W. Bush das excelências da energia alternativa não poluente e mais barata? Éramos o país do sol, da terra e da água, capazes de abastecer o planeta com um produto renovável e muito mais barato do que o petróleo.
Com a descoberta do pré-sal, ficou o dito pelo não dito. Como a moda é sempre encontrar um culpadp para nossos próprios erros, nos corredores do poder já se escutam incriminações aos produtores de cana, “gananciosos em busca do lucro que momentaneamente o açúcar fornece mais do que o álcool”.
Parece coisa de criança, transplantada para as concepções de gente grande, mas não faria mal uma palavra do Lula a respeito de o plano do álcool não ter saído pelo ralo.
O número polêmico
Na recém-divulgada pesquisa da CNT-Sensus um número ficou propositadamente escondido nos variados comentários e análises que se seguiram na imprensa e no Congresso. Mais importante do que Dilma Rousseff haver caído de 23.5 para 19%, ou de que os índices de rejeição da candidata tenham alcançado 37.6%, está a resposta espontânea dos consultados sobre quem elegeriam presidente da República, sem conhecerem a lista de pré-candidatos. Deu Lula, com 24.5%, sendo que o segundo preferido, José Serra, não passou de 1%.
Quem quiser que conclua, mas se por hipótese absurda os detentores do poder decidirem utilizar todos os mecanismos para não perdê-lo, estarão respaldados por indiscutível apoio popular. Um horror, ainda que nem tanto assim afastado de nossas tradições casuísticas. É bom continuar tomando cuidado.
Elogio necessário
Ao depor na Comissão de Ciência e Tecnologia do Senado, ontem, o general Augusto Heleno fez significativo elogio ao ministro da defesa, Nelson Jobim. Como chefe do Departamento de Ciência e Tecnologia do Exército, o general reconheceu haver o ministro levado para a sociedade a discussão sobre defesa nacional e soberania.
Acentuou não tratar-se de assunto militar, pois as forças armadas são o instrumento da defesa nacional e da garantia da soberania. As decisões a respeito, porém, devem caber ao Congresso e ao Executivo, sob consulta permanente à sociedade.
Outra afirmação do general Heleno foi de não estar o Brasil empenhado em qualquer corrida armamentista na América do Sul. Não participamos dela, já que o poder militar deve ser compatível com as necessidades nacionais.