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Com certeza, a Inteligência Artificial cai reduzir empresgos
Miguel de Almeida
O Globo
Não é de estranhar que os bolsonaristas incentivem memes contra Fernando Haddad. Desde já percebem de onde surgem indícios de uma política pública alternativa à polarização — e com resultados. Estranho seria se os alvos fossem Sonia Guajajara ou Anielle Franco, com suas práticas datadas.
O ótimo livro de Daron Acemoglu e Simon Johnson “Poder e progresso”, ao mergulhar na história das tecnologias e de seus reflexos sociais, escancara como a agenda brasileira permanece em sua contumaz esquizofrenia entre moderno e arcaico.
EXTRATIVISMO – Calma, o Brasil não é personagem da obra, porque nossa vocação extrativista é antes um fenômeno sociopatológico, jamais econômico. Nas páginas, encontram-se até pistas para compreender o retrocesso chamado Trump. Ou Bolsonaro, seu êmulo (até nos muitos casamentos).
Como ocorreu noutras revoluções — entre elas a Industrial —, as tecnologias digitais provocaram desnorteamento em muitos setores econômicos, com reflexos imediatos na organização social.
Diversas ocupações foram extintas, muitas profissões perderam seu valor, junto a fábricas hoje obsoletas. Em seu rastro, há bairros e cidades inteiras diante de uma inesperada decadência.
RIQUEZA DO ALGODÃO – Dois momentos da História brasileira poderiam constar da obra de Acemoglu. O Maranhão, no século XVIII, era poderoso produtor e exportador de algodão. Quem conhece Alcântara ainda consegue ver os casarões, hoje escombros, símbolos da antiga riqueza trazida pelo que foi apenas outro fausto tipicamente brasileiro (poderia usar também como exemplo Manaus e seu ciclo da borracha). Os bacanas da época mandavam lavar (e engomar) suas roupas em Portugal…
Como concorrente, Mississipi e suas lendárias plantações. Ambos se apoiavam em mão de obra escrava, quando dois fatos mudaram a vida nababesca da elite maranhense: o aumento de impostos praticado pela Coroa portuguesa (para sustentar os suspeitos de sempre) e o início do uso de maquinário industrial nos Estados Unidos.
Vale lembrar que os americanos, com pouca oferta de trabalhadores, rapidamente buscaram desenvolver equipamentos capazes de incrementar a produtividade. Logo o preço final do algodão brasileiro tornou-se inviável. O resto é decadência.
CAPACITAÇÃO – Outro exemplo é nosso Lula da Silva, migrante nordestino, formou-se torneiro mecânico em curso técnico em São Paulo. Foi trabalhar na indústria automobilística. Não tivesse se tornado líder sindical, a depender de políticas públicas de capacitação praticadas pelos governos petistas, estaria na água (sem duplo sentido). Sua ocupação deixou de existir, tornada obsoleta pela automação.
O caso de Bolsonaro não é tratado em “Poder e progresso”, embora alguns exemplos trazidos por Daron Acemoglu possam ser úteis para entendê-lo. O ex-presidente, por sua infelicidade e deficiência, nunca chegou a ser oficial, dado que se viu reprovado nas tentativas de ascensão militar. É outro que estaria na água caso vivesse na Manchester, centro têxtil da Inglaterra.
A chegada da Segunda Revolução Industrial, em meados do século XIX, exigiu melhor capacitação dos trabalhadores. Mesmo na agricultura, para lidar com maquinário além de enxada e de foice. Passou a ser exigida melhor educação; em muitos casos, conhecimentos básicos de matemática (o Brasil inteiro sabe como Bolsonaro é ruim nas quatro operações, não vou repetir). Sem futuro, ele foi ser político de extrema direita.
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL – Acemoglu, também coautor do imperdível “Por que as nações fracassam”, depois de historiar diversos momentos econômicos da humanidade, se mostra assustado com a falta de política na chegada da inteligência artificial. É experiente e não se empolga com a jequice consumista de trocar de celular a cada ano.
Tampouco com o discurso exalado do Vale do Silício de vender condomínio em Marte. A questão não é inovação, mas o que chama de ausência de prosperidade compartilhada. A tecnologia, no passado e agora, sem política pública, resulta em aumento de desigualdade.
A atual revolução digital deu na Uber, mas também no Facebook e em sua traição política. A primeira trouxe novas oportunidades econômicas; o segundo, o ódio. A Alemanha subsidia as empresas (até quatro meses) que capacitam seus trabalhadores nas novas tecnologias. Idem Japão. Ao contrário dos Estados Unidos, cujo desnorteamento e desigualdade ajudaram a eleger Trump em 2016. No Brasil, a continuar a novilíngua janjística, nem todes (sic) terão as oportunidades dadas a Lula e Bolsonaro.