
O procurador Paulo Gonet acertou ao admitir que fez “cagada”
Editorial
Revista TimeLine
Depois dos interrogatórios do chamado “núcleo 1” de réus da “trama golpista”, a imprensa já está anunciando a prisão de Bolsonaro. Só que a ação é toda nula. Com mais de mil dispositivos eletrônicos apreendidos e 250 milhões de mensagens extraídas, não há prova alguma de que houve uma tentativa de golpe de Estado.
Tudo se resume a uma delação, igualmente nula, do ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro, Mauro Cid. Depois dos interrogatórios, fica claro que não houve nem um planejamento para isso.
INTERROGATÓRIOS ILEGAIS – Sobre os interrogatórios, que poderiam durar a semana toda, mas foram concluídos em poucos dias, muitos advogados apontam que os réus deveriam ter sido ouvidos separadamente, que um não poderia acompanhar o interrogatório do outro. Pois os réus assistiram aos depoimentos dos demais, o que iria contra o artigo 191 do Código de Processo Penal.
Esse artigo estabelece que, havendo mais de um acusado, os interrogatórios devem ser realizados separadamente. O objetivo é garantir que cada réu tenha a oportunidade de se defender sem ser influenciado pelas respostas dos demais, assegurando o princípio da ampla defesa e do contraditório.
Advogados sérios também apontam que foi desrespeitado o artigo 212 do CPP, que determina que as perguntas aos réus devem ser feitas diretamente pelas partes, sendo que o juiz não deve admitir perguntas que induzam a resposta, não tenham relação com a causa ou que sejam repetidas.
IRREGULARIDADES – Foram várias irregularidades apontadas por advogados: violação ao princípio da correlação, que exige que a acusação se limite aos fatos constantes da denúncia; violação ao sistema acusatório, que proíbe que o juiz substitua a acusação e atue como órgão acusador; violação ao direito ao silêncio, que, assim que invocado, deve conduzir ao encerramento imediato do interrogatório…
Alexandre de Moraes foi avisado pelo advogado do general Augusto Heleno que ele só responderia às perguntas de sua defesa. Mesmo assim, Moraes fez perguntas ao ex-ministro, apenas “para registro”.
E isso pode configurar abuso de autoridade, como prevê a Lei do Abuso de Autoridade, no parágrafo único do artigo 15: “Incorre na pena quem prossegue com o interrogatório de pessoa que tenha decidido exercer o direito ao silêncio”
RESERVA MENTAL – A delação de Mauro Cid também é nula, não apenas pelas ameaças, pela coação contra ele, mas porque o ex-ajudante de ordens de Bolsonaro agiu com “reserva mental”. Ele deveria ter passado todas as informações e possíveis provas nos depoimentos para o acordo de delação, o que não fez.
No interrogatório, Cid negou, por exemplo, que houvesse um plano para matar autoridades, negou a existência de uma organização criminosa — ele falou em grupos dispersos, em reuniões dispersas, em “conversa de bar” — e também rechaçou qualquer ligação de integrantes do governo Bolsonaro, das Forças Armadas com os acampamentos em frente a quartéis.
No interrogatório do ex-comandante da Marinha Almir Garnier, o procurador-geral da República, Paulo Gonet, tentou forçar a barra, perguntando se havia algum assessor na reunião dos comandantes das Forças Armadas com Jair Bolsonaro. Foi uma tentativa de implicar Filipe Martins, que foi preso injustamente com o objetivo de se obter mais uma “delação”. Garnier foi categórico: Filipe Martins não estava na reunião.
DELAÇÃO DIRIGIDA – Segundo o almirante, o único assessor presente era o próprio Mauro Cid, cuja participação se limitou a preparar a sala e se retirar. Freire Gomes e Baptista Junior também afirmaram que Martins não estava.
Essa fala compromete profundamente a delação e toda a farsa da narrativa do golpe. Mauro Cid foi o único a tentar envolver Filipe Martins, o que pode sugerir um interesse pessoal claro em desviar o foco de suas próprias ações.
O depoimento de Garnier indica que Cid poderia estar projetando em Filipe (e em outros réus) condutas que ele mesmo provavelmente teria praticado. A ausência de corroboração da narrativa do delator, aliada à evidência de motivação pessoal, fragiliza a validade probatória de todo o depoimento, nos termos do artigo 4°, §16, da lei 12.850/2013, que exige elementos externos para sustentar acordos de colaboração e veda mentiras, omissões ou tentativas de atribuir a terceiros suas próprias ações.
EMBROMAÇÃO – Em seu interrogatório, Mauro Cid disse “não sei” quase mil vezes, e ainda “não lembro”, “acho que”, “me parece que”, “parecia que”, “não tenho certeza”… Mesmo assim, vários jornais moribundos adotam a narrativa de que Bolsonaro não tem escapatória…
Ora, Jair Bolsonaro e os outros réus, mesmo Mauro Cid, confirmaram que foi estudada a adoção do estado de sítio, ou de defesa, e isso, por si só, não pode ser configurado como tentativa de golpe, nem como planejamento, o que não seria crime, da mesma forma. O “golpe de Estado” não existiu. Se alguém, em algum momento, teve a ideia de fazê-lo ficou na cogitação.
Tudo gira em torno de “o que o senhor quis dizer com isso?”, “qual era a sua intenção?”… É preciso insistir: pensar, ter vontade de fazer algo, até mesmo planejar uma ação pura e simplesmente, nada disso constitui crime. Então, o que foi esboçado foram documentos para decretação de um estado de sítio, ou de defesa, dispositivos constitucionais… E essas medidas só podem ser adotadas com a aprovação do Congresso Nacional…
URNAS ELETRÔNICAS – Sobre as críticas às urnas eletrônicas, faltou refutarem firmemente que questionar sistema eleitoral é lícito, é liberdade de expressão. Não há ilícito em “excesso de retórica”.
Há que se lembrar que a PGR acusa os réus de tentarem golpe pelo simples fato de fazerem lives e postarem questionamentos em redes. Paulo Gonet chegou ao absurdo de perguntar se debater decisão judicial seria “jogar dentro das 4 linhas”. Ora, questionar é direito de todos. a liberdade de expressão, de debate, de questionamento tem sido tratada, no curso de todo esse processo, como um ato criminoso, o que é um absurdo completo.
E uma última questão, para deixar claro o que vale para alguns e não vale para outros, o desequilíbrio dessa ação… Bolsonaro queria exibir vídeos de Flávio Dino, Carlos Lupi e Ciro Gomes criticando as urnas eletrônicas. Moraes não permitiu, “por se tratar de prova nova”, mas, no recebimento da denúncia, o próprio ministro do STF apresentou um vídeo que não estava nos autos.
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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG – Excelente editorial, enviado por Mário Assis Causanilhas. Mostra que o Supremo construiu uma narrativa sobre Bolsonaro, que só pode ser usada para inocentá-lo, pois o exibe como um completo idiota, totalmente incapaz de produzir um golpe, por absoluta incompetência. Assim, a acusação é tão ridícula quanto o próprio Bolsonaro. (C.N.)