Decisão do Senado seria “uma afronta” ao Supremo, mas talvez acabe não sendo

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Traficante André do Rap, solto por decisão monocrática

Ricardo Rangel
Veja

O Senado aprovou a PEC que limita decisões monocráticas de ministros do STF (agora vai para a Câmara). O Supremo entendeu a decisão como um ataque frontal à Corte, mas o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, nega. “Não tem nada de atrito, de revanchismo ou qualquer afronta ao Supremo. Muito pelo contrário, é uma posição que a população brasileira espera de nós, senadores, buscando o mínimo de estabilidade jurídica, de estabilidade política.”

Conversa. Claro que foi um ataque. A crítica à existência das decisões monocráticas existe há anos, mas o Congresso nunca votou: agora, do nada, em votação relâmpago, sem mal dar tempo para respirar, ela foi aprovada no Senado. E com o apoio de Pacheco e de Davi Alcolumbre, presidente da CCJ, em uma iniciativa para agradar ao bolsonarismo, que odeia o Supremo e quer enfraquecê-lo.

USARAM E ABUSARAM – À primeira vista, a PEC é uma vitória do bolsonarismo e uma derrota do STF. Mas há aspectos mais interessantes. A PEC existe porque, durante anos, os ministros do Supremo usaram e abusaram, impunemente, de decisões monocráticas altamente polêmicas e, com frequência, absurdas.

Muitas decisões monocráticas de ministros foram revogadas por outros ministros em decisões também monocráticas, criando situações estapafúrdias e grande instabilidade jurídica.

As divergências públicas entre ministros se tornaram tão comuns que muita gente passou a dizer que havia “11 supremos”. Um Supremo caótico, aliás, foi um dos fatores que geraram o bolsonarismo. Como os ministros nunca tiveram a compostura e a disciplina de moderar a si mesmos, ficou por conta do Congresso fazê-lo. A forma e o timing não poderiam ser piores, mas a decisão não está errada no mérito.

FIM DO “EU SOZINHO” – O fim das decisões monocráticas não enfraquece o Supremo, como muitos entendem. Ele enfraquece os ministros individualmente, que perdem autonomia e ficam obrigados a convencer seus pares de que sua visão está correta.

Mas o Supremo, tendo sempre decisões colegiadas, sai fortalecido e muito mais respeitável. É bom para o Brasil — e acaba por proteger os próprios ministros, hoje muito expostos.

É altamente discutível também se a decisão favorecerá o bolsonarismo. As táticas do bolsonarismo contra o Supremo são a fulanização, demonizando em particular os ministros Alexandre de Moraes e Luis Roberto Barroso, e a argumentação (correta) de que decisão individual reflete um único ponto de vista e não tem pouca legitimidade.

MAIOR LEGITIMIDADE – Decisões colegiadas impedirão as duas táticas. E como o único tema de maioria certa no Supremo é a necessidade de neutralizar o bolsonarismo, o tratamento dado pelo tribunal aos bolsonaristas não deve mudar grande coisa. Só será mais legítimo e indiscutível.

O terceiro item interessante é o comportamento de Jaques Wagner (PT), que votou contra a orientação do partido do qual é o líder e contra o interesse do governo. Foi o único. Mas carregou junto votos de outros partidos, foi, possivelmente, o responsável pela aprovação da PEC.

Ninguém entendeu Wagner. Mas algum motivo tem.

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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG
Excelente artigo de Ricardo Rangel. Me fez lembrar a decisão monocrática e imbecil de Marco Aurélio Mello, que mandou soltar o megatraficante André do Rap porque o juiz de primeira instância “esqueceu” de renovar o pedido de prisão. E o ministro – de forma idiota e burocrática – soltou o chefe de facção criminosa, que sumiu no mundo. Fica parecendo que os ministros do Supremo podem ser comprados por 30 dinheiros, como na antiga Judéia. (C.N.)

14 thoughts on “Decisão do Senado seria “uma afronta” ao Supremo, mas talvez acabe não sendo

  1. E enquanto isso, velhinhas com bíblias na mão em frente aos quartéis são presas e condenadas a 17 anos de prisão, em regime fechado, sem direito a recorrer em liberdade… Enquanto isso Fachin anula todas as condenações do cachaceiro asqueroso na Lava Jato… Brasil, zil, zil.

  2. Caro José Vidal, as decisões monocráticas continuam em vários casos.
    André do Rap foi solto pelo ministro Marco Aurélio Mello dentro da lei, pois seu processo não tinha transitado em julgado.
    Reitero: tem de fazer a reforma do Código Penal e do Código do Processo Penal, porém não pode ser feito com esse Congresso com maioria de parlamentares de direita e parlamentares da extrema direita com alguns de diversos partidos sendo investigados por crimes.

    • Desculpe, prezado amigo Nélio Jacob, mas não concordo.

      Além do André do Rap, Marco Aurelio soltou muitos outros do PCC, conforme matéria de hoje na Folha.

      Não se pode alegar que ele simplesmente cumpriu a lei, porque, como juiz, ele estava obrigado a obedecer à Lei de Introdução ao Direito, que é a mãe de todas as leis e da própria Constituição.

      Art. 5º – Na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum.

      Você, como juiz, jamais se comportaria como Marco Aurélio Mello. Ao soltar André do Rap, ele não estava atendendo aos fins sociais a que a lei se dirige nem atendendo às exigências do bem comum.

      Forte abraço e bola pra frente.

      CN

  3. Fica parecendo que os ministros do Supremo podem ser comprados por 30 dinheiros, como na antiga Judéia. (C.N.)

    Sr. Newton

    Não duvido de mais nada….

    A diferença é que os 30 dinheiros, hoje valem bilhões de dinheiros…..

  4. “E como o único tema de maioria certa no Supremo é a necessidade de neutralizar o bolsonarismo, o tratamento dado pelo tribunal aos bolsonaristas não deve mudar grande coisa. Só será mais legítimo e indiscutível.”

    Qual seria a reciproca?

    Haveria em algum tempo um tribunal dedicado a neutralizar o petismo?
    Os tribunais devem ser partidários de alguma ideologia?
    Os tribunais americano recusaram impedir a candidatura do Trump, ou se Trump fosse brasileiro nosso STF o tornaria inelegível?

  5. Impressionante, pra imprensa toda decisão agora tem que se justificar pela luz do vai ajudar o bolsonarismo ou não.

    Ai a medida tá certa mas vai agradar o Bolsonaro, não pode! Ao essa medida é errada, mas vai contra o Bolsonaro então pode.

    Foi exatamente assim que chegamos a este caos, decisões que deveriam se basear na lei, não importando a que político agradar, são tomadas unicamente por conveniência políticas e eleitorais.

    Ai ainda querem que o povo respeite o STF e a imprensa.

  6. Fica parecendo que os ministros do Supremo podem ser comprados por 30 dinheiros, como na antiga Judéia.

    Fica parecendo! Fica parecendo!
    rsrsrsrsrsrsrsrsrsrsrsrsrsrsrsrsrsrs

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