
Helyeh foi banida por defender o povo palestino nos EUA
Demétrio Magnoli
Folha
Helyeh Doutaghi não obteve as manchetes que anunciaram a prisão e ameaça de deportação de Mahmoud Khalil. Ele, ativista da Universidade Columbia, é vítima direta de Trump. Ela, iraniana, professora-visitante em Yale, foi banida pela própria instituição.
Sua história revela as duas faces repulsivas dos dirigentes universitários que consagram seus esforços às políticas identitárias.
VICE-DIRETORA – O capítulo inicial da história transcorreu em 2023, quando a Escola de Direito de Yale convidou Doutaghi a ocupar a vice-diretoria do Projeto de Direito e Economia Política, que se exibe como plataforma pela “igualdade econômica, racial e de gênero”.
Ano passado, ela estrelou um evento do projeto intitulado “Uma Política Econômica do Genocídio e Imperialismo” — que, surpresa!, concentrou-se no “genocídio na Palestina”.
Novidade nenhuma. Faz tempo que Yale renomeia suas faculdades para suprimir personagens conectadas à escravidão e destrói vitrais supostamente ofensivos.
ARTE POLITIZADA – Em 2017, após uma decisão de “descolonizar” o departamento de Inglês, substituiu seu curso de história da arte “da Renascença até o Presente” por um curso focado em “questões de gênero, classe e raça”, além do “envolvimento da arte com o capitalismo ocidental”.
A renúncia à investigação crítica em nome da pregação ideológica é notícia velha. Nesse capítulo, o notável é que Doutaghi não tem o perfil de uma ativista identitária típica. Ela faz questão de usar o véu islâmico mesmo nas salas de aula dos EUA.
Não é “cultura”, mas uma declaração política contra as mulheres iranianas que enfrentam a letal repressão da polícia religiosa no seu país. Bem pior: ela ajuda a dirigir um Comitê de Anti-imperialistas em Solidariedade ao Irã, veículo de política externa patrocinado pelo regime teocrático iraniano.
LIBERDADE DE EXPRESSÃO – Há uma lição, aí. Na sua febre identitária, Yale ofereceu um megafone a uma ditadura que oprime as mulheres e só admite a “liberdade de expressão” dos seus propagandistas.
O capítulo final não é menos feio. Yale justificou o banimento de Doutaghi alegando “conduta potencialmente ilegal”: sua hipotética ligação com o Samidoun, uma rede internacional de solidariedade a prisioneiros palestinos designada como entidade terrorista por Israel e Canadá, cuja atuação sofre restrições também nos EUA e na Alemanha.
O Samidoun celebra os atentados de 7 de outubro em Israel, incensa os “heróis” e “mártires” do Hamas e do Hezbollah, clama pela “morte dos EUA, do Canadá e de Israel”.
DIZ A PROFESSORA – Doutaghi participou de eventos públicos da rede palestina, mas nega que pertença a ela —e inexistem provas de tal conexão. De fato, a acusação de Yale contra sua acadêmica-ativista parece decorrer exclusivamente de pesquisa realizada por um robô de inteligência artificial —e, sobretudo, não aponta crime algum.
O banimento tem motivo diferente. Yale teme a ofensiva de Trump contra a liberdade de palavra nas universidades americanas. Não quer ocupar o mesmo lugar da Columbia, cujo financiamento federal acaba de ser suspenso. Por isso, de joelhos, age preventivamente, fazendo aquilo que imagina ser o desejo da Casa Branca.
Lá atrás, Yale sacrificou a liberdade acadêmica no altar da pregação identitária. Agora, a incinera na pira ardente da submissão à Casa Branca. É um jeito de ser coerente.