
Charge do Laerte (Folha)
Roberto Nascimento
A venda das joias, sejam consideradas “personalíssimas” ou se deveriam constar do Patrimônio da União, é de menor potencial ofensivo para a nação, quando comparada à extrema gravidade da tentativa do golpe de Estado, que chegou perto de acontecer — muito perto mesmo, convenhamos
Os principais personagens no caso das joias, Mauro Cid e Bolsonaro, se comprovados os crimes de peculato, evasão de divisas e lavagem de dinheiro, a pena máxima não excederá oito anos de prisão.
TRANCAR A AÇÃO – Portanto, com a habilidade dos advogados criativos na construção da defesa, Paulo Bueno (Bolsonaro) e Cezar Bitencourt (Mauro Cid), nesse caso específico acredito que o juiz possa até conceder o trancamento da Ação Penal, pois Bolsonaro não tem mais foro privilegiado, deve ser julgado pela primeira instância da Justiça Federal de Brasília, onde morava na ocorrência dos crimes.
A situação de Bolsonaro se agrava mesmo é em relação a esses crimes de ameaça à democracia, tentativa de fraudar o processo eleitoral, utilização de milícias digitais para se perpetuarem no Poder e incentivo e planejamento do vandalismo de 12 de dezembro de 2022 e 8 de janeiro de 2023.
Desses processos a turma golpista não escapa, porque seus autores deixaram pontas soltas. E o quebra cabeça está quase fechado, com nome e sobrenomes dos partícipes.
ROMPIMENTO – Tudo indica que há possibilidade de rompimento entre Mauro Cid e Jair Bolsonaro, que insiste em atribuir ao ajudante de ordens uma suposta “autonomia plena” no caso das joias, afirmação que é apenas uma forma de transferir a Cid toda a culpa pela venda das peças.
Portanto, é preciso acompanhar a movimentação do atual advogado de Mauro Cid, que um dia faz um pronunciamento, no outro se desmente e cria outra narrativa.
Entrevistado na GloboNews” na sexta-feira, o advogado Cezar Bitencourt, que defende Mauro Cid, se contradisse o tempo todo. Pressionado pelas jornalistas Andreia Sadi e Natuza Nery, ele primeiro negou e depois foi obrigado a admitir ter conversado na noite anterior com o advogado de Bolsonaro, Paulo Bueno.
CAI A MÁSCARA – As jornalistas colocaram Bitencourt no canto do ringue, com a seguinte pergunta: “O senhor mantém a afirmação de que não se encontrou com o advogado de Bolsonaro?”
A máscara então caiu e ele foi constrangido a admitir que realmente falou com o criminalista Paulo Bueno. Mas, disse que foi por telefone e no tempo de apenas um minuto.
À tarde, também na GloboNews, em programa comandado por Julia Dualibi, o advogado de Bolsonaro também admitiu que conversou com Cezar Bitencourt, e o tempo então subiu para três minutos…
ESTRATÉGIA DIVERSIONISTA – Está claro que os advogados estão insistindo em discutir a questão da venda das joias, para tirar do foco os crimes muito mais graves que envolvem a tentativa frustrada do golpe de Estado. Essa estratégia diversionista da defesa não deixa dúvida de que os advogados terão muito trabalho para desconstituir a participação de Bolsonaro e Cid na trama golpista.
E a entrevista de Bolsonaro ao Estadão, sexta-feira, dentro de uma padaria muito simples, tomando café com leite, foi um marketing para demonstrar ser um homem do povo, um simples cidadão que luta diariamente pela sobrevivência.
Bolsonaro na verdade recebe quase 100 mil reais por mês entre aposentadoria de capitão, aposentadoria de deputado federal e os 42 mil reais que o dono do PL (Partido Liberal), Valdemar da Costa Neto, lhe paga religiosamente com recursos do Fundo Partidário. Michelle ganha outros R$ 42 mil do PL, e Bolsanaro fatura mais R$ 150 mil mensais com o rendimento do R$ 17,2 milhões do Pix de apoiadores.
ESPÍRITO PÚBLICO – Lembrem que só podemos escrever estas simplórias linhas, sem risco de sermos presos, torturados e até mortos, porque os militares legalistas do Alto Comando do Exército, em maioria dos seus membros, foram contra o golpe de Estado.
Sempre reafirmo o relevante espírito público dos generais. Não entraram nessa loucura, que poderia desencadear numa guerra civil e a até na consequente divisão da nação em cinco regiões autônomas, para as potências externas explorarem os brasileiros com mais facilidade.
A força do país brasileiro está na unidade nacional, nos objetivos permanentes de uma sociedade mais justa e solidária, irmanada na mesma língua portuguesa e no equilíbrio entre os Estados da Federação.